sábado, 26 de novembro de 2011

O POÇO DA CIDADE




O POÇO DA CIDADE

1
Mergulhou no poço da cidade,
mas não para se suicidar.
A lua e as estrelas o chamavam.

2
É natural que venha a velhice.
É natural que venha a morte.
Só não quero perder a minha loucura.

3
Precisei matar os dois homens.
Levei comigo a mulher.
Nova vida começava para nós.

4
Na casa velha havia um homem sem cabeça,
uma mulher com o ventre aberto
e três crianças em volta, mumificadas.
E pediram-me para não escrever sobre isso.

5
A sua pele negra era de uma beleza estonteante.
À noite descobri-lhe os cotos das asas de anjo.
Foi preciso matá-la.

6
Fui encarregado de exterminar os ovos.
Já imaginaram uma proliferação de anjos
nesta terra desolada?

7
Deus não é possível.
Os anjos não são possíveis.
Os homens estão entregues à própria sorte.

8
Não sei nada da minha vida ou da minha morte.
Carrego o silêncio de uma pedra na cabeça.

9
Querem que eu faça parte disto e daquilo.
Eu sou sozinho como os ossos de um crânio sobre uma pedra.
Eu sou uma sombra ao vento.

10
Fui um cavalo selvagem.
Fui uma rosa frágil, uma pedra, um rio.
Duvido que eu seja um homem.

11
Não reconheço a forma da minha cidade.
Estas pedras, estes ferros retorcidos, estes fios soltando fogo
e a fumaça saindo do ventre da terra à medida que as pessoas respiram.








2 comentários:

Luiza Maciel Nogueira disse...

Brandão adorei principalmente:

"Fui um cavalo selvagem.
Fui uma rosa frágil, uma pedra, um rio.
Duvido que eu seja um homem."

as vezes eu tbm duvido.

beijo

Unknown disse...

MUITO LINDO!

A poesia é um caminho onde tudo é possível.

Beijos

Mirze