domingo, 25 de outubro de 2009
A poesia física e outros poemetos
A GALINHA
A galinha deixa na terra molhada as marcas
de seus pés, como uma escrita indecifrável.
Penso nas minhas palavras, que o vento apaga,
indecifráveis e vãs como os signos da galinha.
O FOGO CONSUMIU
O fogo consumiu as memórias do pássaro,
as labaredas se elevaram das casas e das árvores.
As flores se afogaram no sangue, sob as cinzas.
Eu caminhei sozinho sobre as nuvens dos sonhos.
NADA E TUDO
Eu andava num lago de cristal.
Inesperadamente, o gelo partiu-se
e vi surgir da água, batendo as asas,
o milagre do nada e tudo de Deus.
AS ÁRVORES DANÇAVAM
As árvores dançavam na tempestade,
as casas adernavam sobre as águas,
um boi com um nenê no lombo nadava.
Olha!, o nenê, como um pombo, quer voar!
NA VASTA PRAIA
Na vasta praia sonha o sonhador
olhando uma gaivota na crista duma onda,
o ouro do sol queimando as asas fulvas
e a espuma efêmera das vagas apagando-se.
A MULHER-FLAMA
A mulher é só flama, inteiramente.
Avança, uma serpente coleando,
e envolve de tal forma o homem, submisso,
que o queima no êxtase de sua lâmina.
OUTRO HORIZONTE
A minha rude língua na rude língua do vento,
as gaivotas sobre os mastros e as espumas brancas.
A tormenta se anuncia e é sempre manhã no mar
e um outro horizonte é possível e se abre em arco.
TARDE BELA
A tarde bela como uma flauta mágica.
A morte senta-se no colo da Esfinge.
A angústia morreu de parto.
Deus dança sobre o mar e sorri.
A POESIA FÍSICA
A poesia é física como a pedra.
Ninguém pode medir, mas sei
sua medida exata: princípio e fim
em si mesma contida, irreversível.
A ESFINGE
A Esfinge, em seus véus, não sabe sorrir.
Não decide nada; no escuro, não se move.
A Esfinge desconhece a música; é surda.
Cega, é consumida pelo fogo do poema.
O BARCO BÁRBARO
Sou um bárbaro, um barco bêbado de alegria.
É indizível a beleza do estrangeiro afogado
na água dos meus olhos de recifes tenebrosos.
Minha língua me revela a pérola negra de Deus.
O OLHO VERDE
O poeta tinha um olho verde líquido
com árvores e pássaros e peixes nadando.
O poeta tinha a luz nos olhos verdes
periférica, elíptica, concha e sol marinho.
O DRAGÃO DE BRONZE
Era um fascinante dragão de bronze,
com a garganta-angústia do indizível.
Soltava labaredas pelos olhos,
queimava a palavra e seu sucedâneo.
_________________
Estarei fora por uma semana e pouco.
Deixo uma série de poemetos para irem apreciando devagar.
Desde uma simples galinha, Deus, um improvável dragão, até um barco bêbado com pouco Rimbaud na tripulação, tudo é matéria de poesia.
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14 comentários:
Nesta sementeira de versos viçosos, hoje, destaco estes:
"A poesia é física como a pedra.
Ninguém pode medir, mas sei
sua medida exata: princípio e fim
em si mesma contida, irreversível.
L.B.
É difícil dizer o indizível que você consegue com tanta facilidade.
A mulher é só flama, inteiramente.
Avança, uma serpente coleando,
e envolve de tal forma o homem, submisso,
que o queima no êxtase de sua lâmina.
Lindo!
Um dia coloco lá no meu perfil.
Bjs
JC, não consegui ler devagar...mas vou ler de novo. seus poemas tragam de beleza e poesia. então, boa viagem e beijos.
A GALINHA:
se as galinhas voassem meio metro acima seriam elas chamadas de pássaros ?
P A Z !
Tácito
Vocês escreve de uma maneira que quase acredito que é fácil ser poeta. Gostei mto de descobrir sua poesia! Abraços!!!
Que lindo...Quem tem tudo,tem nada,quem tem nada tem tudo...Indecifrável este Lugar!
Oi Poeta!
Tentei enviar esse convite por email à vc e Sônia, mas não consegui. Resolvi fazer por aqui mesmo.
Temporariamente fechei o RASCUNHOS e abri um outro blog junto com o Francisco.
Algumas, bem poucas pessoas, gostaríamos de ter por lá. De repente, menos é mais!
Tê-lo como leitor seria uma honra e uma imensa alegria.
É um blog a quatro mãos e com duas personalidades....rs
Quando tiver um tempo, esperamos sua visita. Começamos hoje e fiz questão asboluta de vir aqui e no blog da SÔnia.
Um beijo com carinho da amiga e admiradora de sempre.
Cris Animal
As palavras fluem por aqui num rio onde pequenos poemas guardam memórias. "Nada e Tudo" - ficou, para mim...
Um beijo
Chris
... princípio e fim
em si mesma contida, irreversível.
Belos poemas, Brandão. A poesia em si mesma contida, independente, possibilitando múltiplas leituras, como o universo, ah, a poesia é um universo em si mesmo contido. Grande abraço.
E eu fico-me pela praia... aí me inspiro, descontraio... Lindos pensamentos.
Voltei para ler !
Agradecer a visita e ler.
É sempre muito mais que essas estrofes, é sempre bem mais do que esas´palavras que encontro aqui. Vai além...bem além.
Essa é alma de um verdadeiro poeta. Aquele que faz a palavra ser infinita, que tira dela todos os limites e nos faz, leitores, entrar por caminhos mágicos e apaixonantes!
"Eu caminhei sozinho sobre as nuvens dos sonhos. "
Acho que Deus foi seu parceiro....rs
façam uma boa viagem e tenham um bom regresso.
Eu?
Esperando mais de vocês!
Com carinho
Cris Animal
Na dança de Deus, no fogo do poema, nos olhos verdes do poeta - o brilho - que faz sorrir a pedra.
beijos
Brandão
Venho sempre aqui e sempre que venho saio com meu coração pleno e cheio de vida. Tua poesia toca-me profundamente, te admiro imenso! Espero que não se importe, postei quadras tuas no meu blog. Gostaria de prestar-lhe uma homenagem pois tua poesia é do melhor, e deve ser conhecida por muitas pessoas. Um grande abraço
Gisele
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