O CORAÇÃO DO
MENINO
O menino está na barriga da mãe como um tesouro que ela
guarda escondido.
O seu coraçãozinho bate junto do coração da mãe, ansioso,
maravilhado.
Aproximei a minha cabeça para ouvi-lo e fiquei
apalermado: tanta energia, tanta vontade de viver.
O seu coraçãozinho não batia: galopava. O que eu ouvi foi
um galope firme dentro da ventania.
A placenta fazia um barulho como uma ventania, e lá o
menino galopava, preparando-se para as ventanias da vida.
Eu não sei o que lhe dizer. Há momentos em que as
palavras são vazias, inúteis como flores murchas.
O menino tem três meses, um tamanhinho de nada, e uma
bruta disposição para viver.
Ele domina o mundo, com a certeza de que a vida compensa,
de que a vida é um milagre.
Eu ouvi o menino bradar, num som de galope, que a vida é
bela e que ele caminha para ela, a toda brida, querendo viver.
Eu compreendi que o menino tem asas e voa para além das
tempestades, até lá onde mora a origem de todas as coisas.
Eu compreendi a mensagem do menino, nova como a primeira
palavra que, vinda do infinito, faz o mundo nascer.
O menino existe para dar luz à escuridão mais fechada.
A sua visão traz a sabedoria essencial do universo.
O poeta é um anjo trôpego batendo numa pedra com seu
bordão de andarilho, à espera de uma impossível resposta.
O menino é essa resposta.
Um comentário:
Que lindeza cabei de ler, José.
Mais que um milagre amadurecido dia após dia, a beleza do ventre de germinar o verso, faz do poeta, menino para sempre.
Meu beijo,
Sam.
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