segunda-feira, 13 de junho de 2011

D'APRÈS MARIANNE MOORE





PALAVRAS

Meu pai costumava dizer:
“Visita dá duas alegrias: quando chega e quando vai embora.”
Não que não gostasse de visitas: era o modelo do anfitrião,
Sempre um cavalheiro, orgulhoso de servir ao outro.
Não citava autores importantes, filósofos ou poetas
­­- embora conhecesse um ou outro poeta.
Para ele a poesia e a sabedoria – a mesma coisa, afinal –
Vinham da terra, da vida, dos homens convivendo com outros homens.
Supérfluo o conhecimento que vem dos livros,
Palavras que ficam, sem sangue, sem a presença do homem.
Meu pai nunca escreveria um poema: palavras vazias
Numa folha de papel, no bronze, no vago espelho do tempo.
O poema era o seu grito apartando as vacas, os bezerros
No final do dia, cansado e orgulhoso de existir.
E as visitas? Estamos na terra de visita
À espera da alegria da partida. Tudo é alegria, diria.


_____________

Espero que Marianne Moore não se revire no túmulo com a heresia que perpetro contra sua poesia.
Parti de um poema dela chamado "Silence", que tem por tema a contenção, e escrevi a minha paráfrase com o título "Palavras", e o silêncio por tema. 
Não resisti ao reler o poema em ver que começa falando do pai, e lembrei do que meu próprio pai falava - fiz o meu poema por impulso. 
Sei que não tem a pureza, a altura do de Marianne Moore, nem era essa a intenção. Apenas um exercício criativo.



3 comentários:

Domingos Barroso disse...

As palavras sem visitas
dentro da alma da gente
não regam o jardim
...

forte abraço,
grande poeta
e amigo.

byTONHO disse...



Com a pá 'lavras' a terra
e ao pó... éticas homenagens!


:o)

Adriana Godoy disse...

JC, uma maravilha seu poema...traz lembranças, sabedoria. sei lá, um aperto na alma. Bom estar aqui, amigo. Beijo