quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Eça e Machado



Josué Montello diz que há escritores de uma língua e escritores de uma literatura. O escritor de uma língua não pode ser transposto para outra sem ser desfigurado, tornando-se irreconhecível. Seria o caso de Eça de Queirós. Enquanto o escritor de uma literatura pode ser transposto para outra língua, como Machado de Assis. Justificando-se assim porque Machado se universaliza, e Eça não, porque as traduções o desfiguram.

Não penso assim. Para mim, Machado é escritor universal, expressa uma visão do mundo que é do Brasil, mas também da América Latina, dos Estados Unidos, da Europa. Eça de Queirós seria o escritor de Portugal, que retrata o sentir português do mundo. Daí a dificuldade de ser traduzido, sentido e apreciado fora de Portugal. Eça escreve para os portugueses, é escritor de uma pátria, ao contrário do apátrida Machado de Assis.

Não conheço as traduções de Eça e suas repercussões no exterior. Mas posso falar bem do nosso tão brasileiro Machado, que eu acabei de chamar de apátrida. Pois tinha um humor tão refinado, intelectualizado, feito de minúcias pegadas a pinça de um Swift, de um Sterne, de um Xavier de Maistre, de um Fielding, etc., e até de um Garrett tão português, que no Brasil tínhamos dificuldade de chamá-lo de brasileiro. Demorou, talvez tenha sido preciso até que estrangeiros viessem aqui estudá-lo, para descobrirmos o quanto brasileiro ele era, na essência, não nas aparências.

Não quero dizer que Eça de Queirós seja menos universal. Quero dizer que sinto Eça como muito português. Com páginas deliciosas, deliciosamente portuguesas. Para mim Eça é o escritor de uma pátria, ao contrário do que diz Josué Montello. Eça é bem português e a paisagem portuguesa mais que presente em tudo que ele escreve, a paisagem física ou humana. Machado e Eça, os dois fizeram muito pela língua portuguesa, pátria de ambos. Como do maranhense Josué Montello, que também fez muito pela língua portuguesa.

5 comentários:

Simplicidade disse...

Obrigada pela visita ao meu humilde blog.
Não sei comentar este post, pois é demasiado erudito para a minha pobre literatura, apesar de ter lido quase todas as obras do Eça.Considero que seja bem português e com romances que continuam a actuais na nossa sociedade.
O "vosso" Machado de Assis é realmente Universal e estou a aprender a conhecer a sua obra.
A idade não tem idade vive no tempo...Obrigada
Beijinhos e um sorriso
Maria

Graça disse...

Curiosa esta análise sobre Eça. De facto, muitas das suas obras só serão verdadeiramente compreendidas à luz das cultura e sociedade portuguesas do século XIX (algumas ainda tão actuais!). No entanto, outros livros de Eça são universais... lembro alguns dos seus contos, o Mandarim, e porque não a sua tradução do original inglês (muito melhorada, diga-se) As Minas de Salomão.

Gostei de vir aqui.

Bom resto de semana.

EDUARDO POISL disse...

Como sempre tudo muito bonito por aqui.
Só passei para dar um abraço


No entardecer,
o sol dança com a chuva
e um arco-íris
no horizonte tinge...
Espera a lua surgir
e entre as nuvens
uma estrela luzir.
Depois, a terra sorri
quando na noite escura
o céu clareia...
Um véu de estrelas
abraça a lua cheia...
O poeta fecha os olhos
e sente o poema
correr em suas veias.
A lua deita no mar
e o sol, novamente
beija a areia.

(Sirlei L. Passolongo)

Neve disse...

Gostei do seu artigo. Admiro muito Machado e Eça, dois grandes nomes da literatura em língua portuguesa.

Unknown disse...

Muito interessante para pensar. Conheço os dois autores, mas melhor o Eça (li mais), é costume surgirem aparentados. por exemplo uma curiosa peça de Maria Velho da Costa, "Madame" que coloca a Mª Eduarda dos Maias ao lado de Capitu, do "Dom Casmurro". Habituei-me portanto a juntar estes dois autores. Mas perante esta reflexão, estou inclinada a concordar contigo. Realmente Machado de Assis será mais universal.
A pensar mais um pouco. Obrigada.

Abraço