quarta-feira, 7 de novembro de 2012

A FESTA MÓVEL - Brasília é uma festa

Brasília é uma festa foi um concurso nacional de contos, crônicas e poemas com o título e tema buscando em seu duplo sentido alcançar as nuances da verdadeira identidade desta cidade planejada, bonita e rica, mas que também é invadida, deturpada e mal vista como corrupta, devido a sua proximidade com os escândalos no poder político do país, segundo os organizadores.
Tive a honra de ser premiado em sexto lugar com o meu poema A FESTA MÓVEL – tradução do título original de Hemingway “The moveable feast”.
Havia bons prêmios em dinheiro do 1º até o 3º lugar, mas posso jactar-me de ganhar um glorioso 6º lugar – fazer esse poema foi um desafio para mim. Já fiz poemas sobre as minhas cidades – Dois Córregos, onde nasci, e Bauru, onde moro, – e sempre é difícil. Agora, sobre Brasília, que eu mal conheço...
A exigência desse tema restringiu a participação: houve apenas 426 inscritos – o que não deixa de ser um belo número.
Fui uma vez a Brasília – receber o Prêmio Brasília de Literatura, em 1991. Era uma sessão solene, num lugar nobre – o Teatro Nacional Cláudio Santoro. Mas nem quiseram ter o trabalho de abrir o teatro para a sessão – que foi realizada na frente de suas portas fechadas, e olhem que havia escritores de bem mais gabarito que eu, como um Antônio Callado, por exemplo.
E a cerimônia compôs-se de discursos políticos. Não se falou de literatura, mas dos políticos que fizeram isso ou aquilo. A literatura não merecia ser assim relegada a um segundo plano.
Brasília estava seca como o diabo. O diabo é seco? Não me ocorreu outra imagem. Me ofereceram um excelente hotel para passar uma noite, mas no dia seguinte não havia voo referente à passagem que me pagaram e tive que comprar uma outra, de outra companhia, com o meu dinheiro – aliás, com o dinheiro do prêmio, felizmente havia uns caraminguás do prêmio.
Com toda essa experiência de Brasília, que poema eu poderia escrever para louvá-la? Sim, a chamada do título falava também em corrupção e escândalos – mas um poema sobre corrupção e escândalos? Pesquisei alguma coisa da história de Brasília e fiz o dever de casa. Considero o resultado fraco, mas me sinto recompensado: fui apreciado por um júri de valor. O critério central deveria ser a experiência brasilense – parece que até nisso eu me saí bem.
Ei-lo:


   
   A FESTA MÓVEL



O planalto estendia-se calado como no Gênesis, reto, infinito.

Eis Brasília
no mapa
pela primeira vez.

O Eixo Monumental e o Rodoviário no Eixão se cruzam

e eis o Ponto Zero
                  da cidade
                                                móvel.

Onde foi o planalto,
onde o cerrado,

nasce a cidade,
com arquitetura desusual

        – a mais que capital.

No espaço desse nada nasce mais que a metrópole: a nação futura.

Nasce a rosa dos ventos brasileira
– o oeste
de todo o nosso território.

Brasília se tornou um Eldorado.

De uma ideia,

concreto
no concreto,

nasce o centro nervoso do Brasil.

Brasília é uma festa para os cinco sentidos.

Brasília não é um desenho simples
– é coreografada:
     
      as suas peças

fluidas

 são como um dançarino
                      
no ar
            congelado

em momento de absoluto
   equilíbrio.

Brasília é a festa móvel.

A sua arquitetura é a juventude encarnada
– a genialidade

vinda da singeleza
        e da surpresa.

Brasília deu curvas à paisagem descampada.

Brasília é o limite
      entre o concreto
e o ideal.









Um comentário:

Fred Caju disse...

Transparece o desafio que você enfrentou para escrevê-lo. Muito bom!