quinta-feira, 13 de maio de 2010
O duplo
Ele
Comia o miolo dos macacos
Para espertar a inteligência.
Cochilava ao pé da fogueira
Embriagado de pirilampos e estrelas.
Vivia coberto de limo,
Era como um filho da terra brotando.
A água jorrava dos seus olhos
Como uma fonte de rosas e lua.
Eu era menino e ancião
Com um machado no pulmão perfumado.
Ele se chegava com terra na mão
Dizendo: Coma, meu filho.
Eu era ele de cócoras
Com a vida sangrando do beiço grande.
_________
O tema do duplo sempre me obcecou. Não seria o caso deste poema? Não foi a intenção, mas agora mesmo me ocorreu: não foi mesmo?
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11 comentários:
Meu amigo
Muito conseguido este poema, adorei.
Beijinhos
Sonhadora
Brandão,
Este duplo é benigno. É um Enkidu [da epopéia de Gilgamesh] já domado.
Abração.
O duplo... O outro eu, indomável, a morder a individualidade.
L.B.
Quando leio seus poemas, acho que me fundo com a natureza, e nem pretendo me separar dela depois.
Beijos.
Alguma coisa de outro sempre existe em nós, e se revela no beiço grande que sangra, no ancião, naquilo que nos toca fundo sem explicação.
E esse poema me lembrou meu filho, que aos quatro anos eu peguei cavando e provando a terra do jardim.
Fosse o que fosse, eu adorei o soneto!
Um beijo e bom fim de semana.
Acho que pode sim, JC. Também sinto um certo fascínio pelo outro, ou o duplo. Apreciei bem o poema. bj
Excelente.
Octávio Paz nos fala de um outro dentro da gente fazendo o poema.
Fico empertigado como esse menino que recita palavras o tempo todo em meu ouvido.
Se eu fosse outro, me chamaria José Carlos Brandão.
"um machado no pulmão perfumado"
- excelente.
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