As águas correm, correm para sempre.
Sou só, sou a paisagem verde e Deus.
Uma garça branca pousa na margem do rio.
O sol pousa no horizonte vermelho.
Por que contemplar? Por que a luz, o êxtase?
Além do horizonte ergue-se um novo horizonte.
A árvore se transfigura, como Cristo.
A árvore sofre, agoniza, como Cristo.
Os frutos pendem da árvore, como pássaros maduros.
Colho os frutos e canto e conheço.
Como o sol, as águas correm para sempre.
A terra seca, o deserto onde não medra a semente.
Não edifico a minha casa nessa terra.
Este é o campo da penumbra.
Este é o campo da penúria, do silêncio seco de Deus.
Preciso de água para a minha argila.
Preciso de argila para o meu cântaro.
Preciso do cântaro para a minha face.
Modelo a minha face à imagem da face de Deus.
As águas correm para sempre.
Onde as águas que correm para sempre?
As vigas da minha casa estão podres.
Onde a palavra nova que sustente a minha casa?
Ouça o vento, que enferruja o arado.
Ouça o lamento dos sulcos, que esperam a semente.
Ouça a semente amarga florindo no meu túmulo.
As águas fluem, os horizontes fluem.
O pássaro e o trigo fluem, com a terra amarga.
No princípio era o verbo, eram os alvos lençóis.
No princípio eram as águas.
No princípio eram as garças brancas sobre as águas.
E as águas correm para sempre.
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