Nascimento de um romancista
Quando lancei meu segundo livro, “Exílio” (1983), no Instituto Dona
Escolástica Rosa, em Santos, Benilson Toniolo era meu aluno. Tinha 15 anos de
idade e começou a sonhar com a literatura. Depois Benilson estudou História,
com pós-graduação em Ciência Política e especialização em Realidade
Latino-Americana, foi secretário de Cultura em Campos do Jordão, cidade que
prima justamente pela valorização da Cultura, é presidente da Academia de
Letras de Campos do Jordão e membro correspondente da Academia Bauruense de
Letras. Publicou vários livros de poesia, contos, crônicas, memória, arte e
biografia. É um poeta com voz própria, o que define um poeta.
“Barra-dos-Meninos” é seu primeiro romance.
“Ainda está longe, a morada” é a abertura do romance. Apresenta-se o
primeiro personagem sofredor desse lugarejo do Sergipe, lá no fim do mundo. É
Cascalho, que depois se torna Raimundo, sofrendo como se carregasse o mundo nos
ombros. Está apresentado o romance e o leitor não vai mais abandonar o narrador
até que o livro se fecha. Os problemas daquela vida esquecida de Deus e dos
homens continuarão. O leitor sente um peso no peito – o que será daqueles
meninos? Porque, como bem diz o nome, Barra-dos-Meninos, é uma vila de meninos.
Desde o mais velho, Liduíno, que lê muito e tem consciência dos problemas do
lugar, até o último dos “meninos”, todos parecem de fato meninos – estamos na
infância da humanidade, quando os meninos nunca irão crescer, assim como seu
sofrimento nunca vai acabar.
O cego Irineu tem a poesia para viver, para ajudar o povo pobre da vila a
viver. Declama os seus versos na feira e ganha uns cobres minguados – afinal,
ninguém tem dinheiro – em pagamento. O pajé Moerekoara e sua tribo vivem à
margem da rodovia federal, à margem da vida. Convivem pacificamente com os
habitantes da vila. O pastor Divino, novo no lugar, implica com os índios, mas
acaba cedendo, afinal eles são os legítimos donos daquela terra. As mulheres
sobrevivem, com mais dificuldade. Violeta, que veio de longe para pesquisar caranguejos,
é objeto de desejo dos homens, esses homens que parecem crianças. Estão
aprendendo a sonhar, eles que nem sonhar sabiam.
Benilson Toniolo vive em Campos do Jordão, no alto da montanha,
respirando entre os pinheiros e a arte, mas nasceu em Santos, de pai
nordestino, e foi criado perto do mangue de Vicente de Carvalho, no Guarujá.
Foi criado ouvindo histórias como essas que conta, convivendo com personagens
semelhantes aos pobres infelizes de seu romance. Foi como se essas histórias
tivessem ficado incubadas à espera de serem despertadas numa visita do autor a
Aracaju. Era preciso contar essas histórias, sem enfeites, para mostrar “A
vida, apenas”, como diz no título de um capítulo. “A vida apenas, sem
mistificação”, disse Drummond.
José Carlos Brandão