sexta-feira, 19 de março de 2010

O córrego




O córrego


Os brotos de bambu crescem rodeando a casa,
A água parada brinca com os girinos,
Giram no ar as jabuticabeiras pesadas,
As pedras sonham com a carne dos lagartos.

A cadela delira com o dia das maritacas,
O joão-de-barro palpita com a sua casa,
O arado levita nas asas do beija-flor,
A orquídea eleva a árvore acima do sol.

A vida clara estala na cacimba,
A borboleta adora a terra vermelha
E as flores semeadas no canteiro.

Meu canto engorda na ponta dos dedos,
As laranjeiras adernam no quintal.
No córrego a beleza nua e límpida.

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Ao Vasqs, que gostaria de ter escrito um outro poema, O Orvalho da Amora, que falava do córrego da infância, escrito no mês passado, enquanto este é do século passado, dever ter uns doze anos,
também à Claudinha, que não pode lembrar que eu nasci em Dois Córregos sem rir, e nem sabe que minha cidade tem três córregos, nasceu na confluência do córrego Fundo com o Lajeado, que se unem para formar o do Peixe, que vira rio, cresce, torna-se o Rio Jaú, que vai dar nome à cidade vizinha.
Carlos Reichenbach fez um filme chamado Dois Córregos, mas sem querer engana o incauto que vê uns córregos enormes, o rio Jacaré e o rio Tietê, que também banham o município de Dois Córregos.
Quando meu casei, fui morar na beira de um córrego, as vacas e as éguas de noite vinham se coçar nas paredes da casa, ou poderia ser uma anta, havia antas e capivaras por ali.
Mas o córrego da minha infância é bem longe dali, no pedaço de mato onde eu nasci, lugar que um dia foi tão grande que chamaram de Matão, e o córrego corria nos fundos de casa, não tão perto quanto o poema faz supor, havia antes uma imensidão de pés de jabuticaba, nunca vi tantos juntos depois, havia muitos outros pés de fruta, havia o mangueirão dos porcos, havia pássaros e outros bichos e havia encantos muito mais que o poems faz supor.
Ninguém acredita, mas eu nasci no paraíso.

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7 comentários:

Marcelo Novaes disse...

Brandão,





Acredito, sim, que vc tenha nascido no paraíso.



"A orquídea eleva a árvore acima do sol".

J.F. de Souza disse...

Não nasci no paraíso. Por isso, gosto de cada imagem desse que vejo. :)

1[]!

Primeira Pessoa disse...

rapaz, a imagem desse "corguim"passou dentro de mim... vazou... enchente de lembranças...

muito mais que valeu!

dade amorim disse...

O paraíso é forte demais, não havia outro jeito senão fazer poemas sobre ele, José.

Adriana Godoy disse...

JC, acredito cada vez mais que vc nasceu no paraíso...o poema retrata tão bem esse clima. Seus poemas encantam cda vez mais e sempre. beijo.

Fernando Campanella disse...

Engraçado, Brandão, sou totalmente urbano, sempre morei na cidade, mas não sei por que me sinto assim como você, recriando esta paraíso mítico dos córregos, das jabuticabeiras, laranjeiras....ah, mas minha casa da infância tinha um quintal enorme e lá havia horta, árvores frutíferas.... e eu ouvia estórias, e naquela época tinha medo do quintal à noite.... Hoje tudo isso é memória, e me encanta, acho que nós poetas somos como 'zumbis' vagando nesta sombra de memória, iluminando-a com nossos versos.

Grande abraço.

Gerana Damulakis disse...

Eu acredito, pois só assim se justifica tanto talento para colocar em versos a natureza.