quinta-feira, 29 de setembro de 2011

A LIBÉLULA





























A LIBÉLULA


Uma libélula beija a água do espelho.
Uma libélula sustenta a balança do mundo.

A água e a pedra se completam.
A libélula contempla o caos no fundo d’água.

As montanhas marcham como elefantes.
Os olhos da morte me acolhem.
Eu sonho com uma estrela na língua.

O conhecimento do esplendor
é o conhecimento da dor.

                       J. C. Brandão




terça-feira, 27 de setembro de 2011

QUEDA (poemetos)


























QUEDA

Caíram-me as asas.
A dor nos ombros
me lembra que estou vivo.


DESTINO

Estou plantado na terra
com o sol por testemunha.

Mastigo pedras e estrelas
e as palavras se iluminam.


AS ÁGUAS

As águas sempre novas
me renovam.

De onde venho? Da montanha.
Para onde vou? Para o mar.

Por quê? Meu destino é correr.
O ontem me habita. Sou amanhã.


A PEDRA

A pedra já foi água.
O mais íntimo do seu silêncio
é líquido.


A PALAVRA

A palavra é inútil.
Toda poesia
está no silêncio.
                                              
                                               J. C. Brandão


               Fiz uma Antologia Pessoal do meu livro O Silêncio de Deus para o portal de literatura Cronópios. Quem quiser conferir: http://www.cronopios.com.br/site/poesia.asp?id=5173



segunda-feira, 26 de setembro de 2011

INDÍCIO (poemetos)



























INDÍCIO

Todas as árvores cantam,
mas as pedras não.


CONSTATAÇÃO

Do outro lado do espelho
não há ninguém.


GÊNESE

O pássaro nasce do ovo
como o poema.


SILÊNCIO

A semente,
ainda na flor,
é música.        


O ESPELHO DE BRONZE

Escrevo o poema por amor.
A morte é o seu alimento.

Gravo-o no bronze do tempo.
No bronze eu me espelho.


ÍNTIMO

O silêncio da aranha
e o silêncio do poeta
tecendo a teia da noite.

        José Carlos Brandão



domingo, 25 de setembro de 2011

O peso das coisas (9 haicais)



Cidade submersa
multiplicada no espelho
das águas que passam.

O peso das coisas
só coisas, pedra ou pó
no caminho.

Os meninos brincam.
O escorpião toma sol
perto da porteira.

A lua se alonga
na beira do poço.
Ouve a sombra na água.

Ouco o violino
modulando a solidão.
Como pesa a vida.

No quarto úmido
a vela bruxuleia
e se apaga.

A flor roxa dança
a sinfonia das abelhas
na harpa do vento.

Sobre a pedra escura
as formiguinhas sucumbem
ao peso das flores.

A garça dança
sobre o espelho d’água
com a sua imagem.



sábado, 24 de setembro de 2011

O MARRECO PRETO (9 HAICAIS)

























O marreco preto
pousa num galho à flor d’água.
Vida colorida.

As nuvens escuras
tornam a terra e a água escura.
Um peixe agoniza.

No meio da mata
entre a pedra e o musgo
as águas da cascata.

A rosa vermelha
enorme, em primeiro plano.
Os espinhos sangram.

O cachorro me olha,
cresce diante de mim.
Ainda é paisagem.

O céu e as árvores
refletidos na água.
As nuvens acenam.

As casas, a igreja
à sombra das montanhas.
A cidade dorme.

A festa dos pássaros.
O horizonte iluminado.
O sol queima as árvores.

Brilha a flor vermelha
com os seus pistilos negros
em êxtase ao sol.

                                             J. C. Brandão



sexta-feira, 23 de setembro de 2011

A ORELHA DE PAU (10 haicais)


























A orelha de pau
domina o tronco caído.
Dói na solidão.

Ainda brilha o sol.
Olho o grilo na janela
que me olha.

Uma flor de ipê
caminha no asfalto
sobre uma lagarta.

Vou só pela estrada.
Um tucano me chama
do alto de uma árvore.

Uma borboleta
pousada sobre as pedras
do meu caminho.

Bolo de fubá.
A erva-doce entre os dentes
e a infância na língua.

Uma estrela caiu
entre as flores do jardim.
Navego no espaço.

Silêncio. Um relâmpago.
Até as flores se calam
e os peixes do lago.

Perfume de outono
no vento das araucárias.
Sinto o mar na língua.

Mangue ao luar.
O caranguejo caminha
quase em silêncio.

         José Carlos Brandão



quinta-feira, 22 de setembro de 2011

A BALTHUS






























   BALTHUS


A árvore nua no pátio
a menina na janela
e o gato

A cortina aberta
mostra
a morta

O besouro na rosa
o gato é um sátiro
e pinta

O velho capenga
olha as formas
e a cor

A velha perplexa
penteia a jovem
nua

Na mesa
a fruta sangra
e a faca assassina

A blusa vermelha
o copo vazio
e o corpo estendido

Os longos cabelos
da musa
a nudez de perfil

O mundo é um palco
a criança descobre
e Balthus é o rei dos gatos

            José Carlos Brandão